Declaração conjunta do presidente do Comité Económico e Social Europeu e do presidente do Grupo para os Direitos Fundamentais e o Estado de Direito do CESE
Em 25 de maio, George Floyd, um cidadão estado-unidense de 46 anos, morreu asfixiado durante a sua detenção por um polícia do Departamento de Polícia de Mineápolis. À medida que as imagens chocantes desta detenção brutal de um cidadão afro-americano se tornaram virais, os EUA e vários outros países um pouco por todo o mundo foram sendo palco de uma vaga crescente de protestos que vieram abanar as consciências.
É impossível ficar calado perante tal tragédia, tanto mais que o assassinato de George Floyd não é, infelizmente, um caso isolado. Para além de muitos outros exemplos de discriminação das minorias, a imprensa denuncia regularmente os crimes de natureza racista dos quais são alvo, em particular, os afro-americanos.
O racismo e a discriminação envenenam lentamente as nossas sociedades a partir do seu interior – nos EUA, na Europa e no resto do mundo. Somos sempre solidários com as vítimas destes abusos, mas é evidente que a solidariedade não basta. Com efeito, as vítimas do racismo não são apenas aquelas cujo direito fundamental à vida é brutalmente ceifado e cujos nomes são, infelizmente, capa de jornal. São também vítimas todos os membros dos grupos discriminados que sentem que têm de manter uma atitude discreta para garantir a sua segurança e a das suas famílias.
A ideia de que todos são iguais perante a lei e devem ser tratados de forma justa e imparcial é a pedra basilar do princípio do Estado de direito. Não pode haver justiça se não pudermos confiar nas instituições cujo papel é precisamente proteger e garantir a justiça. Não há Estado de direito se a «ordem e segurança pública» for seletiva e não proteger todos os cidadãos de forma idêntica e equitativa. Seria simplista e injusto imputar responsabilidades gerais a instituições públicas específicas.
Não pretendemos fazer juízos precipitados, mas sim exigir justiça. Com efeito, temos de enfrentar e resolver um problema estrutural profundamente enraizado e, para, isso,temos de estar mais atentos. Há um racismo institucional extremamente arreigado nas nossas sociedades que contaminou a nossa forma de pensar, de tal forma que uma simples declaração de solidariedade e de indignação não basta. Temos de identificar e combater com determinação os padrões de pensamento e as ações discriminatórias em todos os quadrantes da sociedade.
E temos de escutar e compreender as exigências pelas quais os manifestantes destes últimos dias procuram erguer a sua voz. Os protestos são um apelo para que haja «justiça para todos» e se ponha termo a uma «ordem e segurança pública» aplicada de forma discriminatória.
É de lamentar que os protestos, em larga medida pacíficos, tenham sido marcados por alguns distúrbios e pilhagens, que, evidentemente, importa impedir e punir. No entanto, estes acontecimentos não alteram a mensagem fundamental da maioria dos manifestantes. Cumpre às autoridades garantir que a população pode exercer o seu direito de manifestação e de reunião, o que exige coragem, empatia e uma conduta exemplar por parte dos serviços de polícia aquando dos protestos.
Para além da urgência destes dias, a cólera popular não diminuirá se a justiça não funcionar. Impõe-se uma inquérito imediata, eficaz e independente à morte de George Floyd. Exortamos também as autoridades a tomarem medidas eficazes para garantir que os direitos humanos são respeitados em todas as circunstâncias e que os serviços de polícia realizam a sua missão sistematicamente em conformidade com esses direitos.
Estamos cientes de que muitos Estados-Membros da UE enfrentam dificuldades semelhantes – o racismo e a discriminação também estão perigosamente presentes nas nossas sociedades. O nosso apelo destina-se, portanto, a todas as autoridades competentes de ambos os continentes: devemos redobrar de esforços para combater o racismo e a discriminação. E devemos respeitar e proteger os direitos humanos e garantir vias de recurso eficazes sempre que ocorram abusos. Quem comete, permite ou encobre crimes de natureza racista e difunde ou promove discursos de ódio, em particular no exercício de poderes públicos, deve responder perante a justiça, sem complacência.
O que está a suceder deve ser uma lição para todos nós, em ambos os lados do Atlântico. Quando uma grande parte da população não pode confiar plenamente em quem é suposto protegê-la, é a própria fundação das nossas sociedades democráticas – que mantém a coesão entre os indivíduos − que corre o risco de se desmoronar.
Luca Jahier
Presidente do CESE
José Antonio Moreno Díaz
Presidente do Grupo para os Direitos Fundamentais e o Estado de Direito