Carlos Trias Pintó: esta crise constitui um alerta muito sério de que temos de mudar o nosso estilo de vida

Ao início, a minha preocupação foi reunir a família, uma vez que o meu filho mais velho estava a estudar nos EUA. Foi uma grande alegria estarmos todos juntos de novo. O confinamento inicial permitiu-nos voltar a passar os serões em família, a ver filmes juntos, a jogar jogos de sociedade. Tudo isto num contexto de grande desassossego: Madrid era, nessa altura, uma das cidades europeias mais afetadas pela COVID-19, o sistema de saúde tinha colapsado e a falta de material médico obrigava os meus amigos médicos a lavar as suas próprias máscaras, uma vez que não havia equipamento de substituição. Tanto eles como as respetivas famílias acabaram rapidamente contagiados. Ainda assim, prevaleceu um sentimento de comunidade: todos os dias, às 20 horas, irrompiam aplausos das varandas de Madrid.

O confinamento foi o pontapé de saída para uma resposta dinâmica, e eu próprio fui recrutado – uma vez mais pela nossa sempre ativa vice-presidente Isabel Caño Aguilar – para contribuir, em nome do CESE, para a resposta da Aliança Europeia contra o Coronavírus, gerida com generosidade, flexibilidade e visão pela Plataforma Europeia para a Colaboração entre Polos Empresariais.

Trata-se de um espaço aberto e horizontal, onde começaram a germinar as primeiras respostas do tecido industrial, que incorporavam também as ações dos criadores (os makers) e as propostas de valor da comunidade, como a iniciativa «Achata a curva», e se conjugavam com uma função mais estratégica de exploração dos ecossistemas europeus e de cocriação de soluções, a partir dos três vetores incontornáveis de toda e qualquer ação futura: ecologia, digitalização e resiliência.

A sociedade tem agora de interiorizar que esta crise constitui um alerta muito sério de que temos de mudar o nosso estilo de vida, embora haja quem queira regressar ao statu quo.

Esqueçamos as receitas do passado. Dita-nos o bom senso que devemos adotar modelos de cooperação e estabelecer todo o tipo de parcerias entre diversos intervenientes que contribuam para a Europa inclusiva, social, humana e ética por que há tanto ansiamos, após inúmeras estratégias e políticas por concretizar.

Mas é verdade que nos últimos três meses realizámos mais progressos do que nos dez anos que se seguiram à Grande Recessão de 2008, o que é muito encorajador.

Não estou de modo algum satisfeito com a resposta das instituições do meu país, pautada pela divisão política e pela descoordenação. Deposito, porém, esperança na capacidade de reação de algumas instituições da UE, nomeadamente da Comissão Europeia, do Banco Europeu de Investimento e do Banco Central Europeu. O excelente papel que estão a desempenhar deve-se ao facto de terem sido capazes de renunciar ao paradigma do ensimesmamento e da autocomplacência em que se encontravam mergulhadas. Abandonaram, por fim, a sua abordagem autocontemplativa e descobriram que é na interação e na construção de alianças – assentes na transparência e na confiança (que, insisto, são indissociáveis) – que reside a chave para o futuro.

Sigamos, pois, na sua esteira, guiados pela bússola do Pacto Ecológico Europeu e da consecução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. Chegou a hora!